sexta-feira, 23 de julho de 2010

CINEMA DE RAIZ


Diretor pernambucano Guel Arraes retoma em "O Bem Amado" a cultura nordestina com bom humor

Nascido em Recife, Guel Arraes é um nome mil e uma utilidades. De criador, roteirista a diretor, ele se enveredou pelo mundo televisivo nos anos 80 de onde não saiu mais. Ele é responsável por programas marcantes como "Armação Ilimitada", "TV Pirata", "Os Normais" e "A Grande Família".

No cinema ele imprimiu a cultura nordestina nos filmes "O Auto da Compadecida", "Caramuru - A Invenção do Brasil" e "Lisbela e o Prisioneiro". Agora ele retorna com a comédia passada no nordeste, "O Bem Amado" (Buena Vista) que estreia hoje. A produção é baseada na peça "Odorico, o Bem Amado e os Mistérios do Amor e da Morte", de Dias Gomes, escrita em 1962. O texto ganhou uma adaptação para a televisão na novela "O Bem Amado" em 1973. Nos anos 80 se tornou uma série que ficou cinco anos no ar. Em 2008, os palcos ganharam a versão teatral com Marco Nanini na pele do prefeito Odorico Paraguaçu e o reprisa no filme de Arraes. Confira a seguir um bate-papo exclusivo com Guel Arraes.

Como surgiu a ideia de fazer a adaptação de "O Bem Amado" para o cinema?
Eu conhecia a obra há bastante tempo. Eu fazia muitas adaptações literárias entre 1998 e 2000, como "O Auto da Compadecida", lia muita comédia nacional e acabei lendo a peça "O Bem Amado". Achei uma ótima comédia. Desde que eu comecei a me enveredar por esse gênero, sempre tive a vontade de fazer uma comédia sobre política. Meus pais, meus parentes sempre estiveram envolvidos com a política e por isso sempre acompanhei o tema de perto. Os dramas, as tragédias de William Shakespeare sempre estão ligadas ao poder e há poucas comédias sobre o tema. "O Bem Amado" é muito boa e uma das poucas obras de sátiras políticas.

O filme é uma sátira política que estreia em ano de eleições. O filme serve para dar umas alfinetadas nos políticos?
É, isso foi coincidência (risos). O filme é uma sátira política. Junto com a vontade que eu tinha de fazer um longa com esse tema, acredito que o momento é bom, não porque é ano de eleições, mas porque há um período muito longo de democracia no Brasil, em que se discute política, em que há liberdade para ser discutido, as pessoas se interessam pelo tema e em denunciar os maus políticos, mobilizadas... Pode ser um bom momento para isso. As pessoas querem rir um pouco dos maus políticos. Se vê muito a denúncia jornalística, mas não há tanto a sátira política. O Odorico Paraguaçu é um excelente personagem para isso.

"O Bem Amado" tem a marca Guel Arraes ao retratar no cinema a cultura nordestina. Fale um pouco sobre isso.
É engraçado porque no cinema a maioria das coisas que eu fiz tem uma temática nordestina. Na minha carreira, os trabalhos que fiz na televisão não tem tanto esse tema. A cultura nordestina é uma referência forte para mim. Mas coisas que fiz na TV, como Armação Ilimitada, TV Pirata, Os Normais na verdade não têm esse tema dominante.

O senhor tem uma grande experiência na TV. Quanto ao cinema, o senhor nota diferenças estéticas e linguísticas em relação a televisão.

Tem uma determinada área da televisão que tem coisas bem próximas ao cinema. É comparável a fazer um programa especial na televisão. Um programa desse para a TV aberta precisa dar audiência e ter uma inquietação artística. Um bom filme comercial precisa dos mesmos elementos. Nisso a é fácil transitar entre a televisão e o cinema. Mas não se pode comparar um filme experimental com uma novela de televisão. Há determinados programas na televisão que se parecem com determinados filmes. E outros não, são completamente diferentes.

O senhor é um homem da comédia. Imagina-se realizando um outro gênero?
Eu tentei um pouco com o filme Romance. Ele é basicamente romântico. A comédia é onde eu tenho mais experiência. Eu nem achei que seria um diretor de comédias, mas fui sendo levado pela situação. Quando eu estava começando minha carreira achei muito mais que eu iria dirigir um drama. Eu não sou um homem engraçado, mas por acaso fui me especializando. De uns tempos pra cá até variei um pouco nas comédias em que eu trabalhei, nas coisas que eu tenho escrito.

Quanto ao mercado brasileiro, como o senhor vê a situação do cinema nacional?
Estamos vindo de um período bem longo de estabilidade com produção contínua e sempre há uma melhora na qualidade dos filmes. A grande novidade deste ciclo seja o fato de ter tantos filmes em variados gêneros para o grande público. Antigamente os filmes para o grande público eram muito mais raros e bem mais focados em um determinado tipo de audiência. Houve o período da pornochanchada, os filmes infantis da Xuxa e Os Trapalhões. Hoje em dia se tem desde filmes com preocupação social como Cidade de Deus, Carandiru; até comédias como Os Normais, Se Eu Fosse Você. Há um leque muito variado de filmes para o grande público. Além disso, aumentou muito a qualidade das produções. Os filmes são interessantes e não puramente comerciais. Talvez essa área do cinema nacional tenha se desenvolvido e firmado mais do que a área de cinema experimental, que sempre foi uma marca forte com o movimento do Cinema Novo. Hoje o cinema popular brasileiro adquiriu mais prestígio e mais comunicação com o público.

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